sexta-feira, 26 de julho de 2013
quarta-feira, 24 de julho de 2013
CONSIDERAÇÕES SOBRE A PATERNIDADE
Paiê. Do berço me espiam dois olhinhos, os braços apontados em minha direção. Corro buscá-la, abraçá-la, infinitos beijos e apertos, cantos e risos, e assim é o início diário de mais um dia.
E minha convicção? A sentença de pedra que, a exemplo de Nietszche, proferi? “Filhos, não quero tê-los, jamais os terei”. Como tudo que digo é resultado de uma reflexão, de muita reflexão, da impressão de leituras, do que me fica das conversas, do que aprendo dos exemplos, que Hugo afirma não ser a melhor coisa da vida, mas a única, das análises e exercícios de futurologia, explico como cheguei a esta afirmação.
Somos humanos, temos de crer nisto. Somos animais, somos espécie, por mais evoluída (os naturalistas podem achar que menos) que seja esta espécie, funcionamos como todas as demais da fauna terrena, nosso impulso primordial é a perpetuação. Com sete bilhões de pessoas habitando, neste exato momento, este mundo, a raça humana pode dispor de mim para sua continuação (imaginem, neste mesmo exato momento, quantas crianças estão sendo geradas, nas alcovas do mundo afora).
Descartado este primeiro motivo, o fundamental, o segundo, existencial, vai-se fácil. O desejo de ter filhos é o ápice de nosso egoísmo, precisamos de alguém para incutir nossos valores, para ser a nossa imagem e semelhança, para realizar nossas frustrações. Eu sou tão egoísta, que nem isto quero partilhar.
Pronto! Filhos, melhor não tê-los! E eu parava por aí a leitura do Poema Enjoadinho. Mas tive uma filha, e façam-me um favor, não queiram entrar neste mérito, vasculhar a história, o que acontece em uma cama ardente, cabe só a quem se incendeia.
O que está posto agora é, o que virá? O mundo continua sua degradação (lembram-se, eu dizia há vinte anos atrás que da Patagônia à fronteira norte do México seria apenas uma única favela – e será – com pequenas ilhas de civilidade - será?- , e o jardim amazônico devidamente internacionalizado), o homem cada vez mais vil, o tal vil metal que cada vez mais poucos vêem, a superstição e a fé mística avançam mais que o conhecimento científico, embora este se multiplique à velocidade dos ultra-mega-super-giga-bytes.
Este é o mundo e este é o conhecimento que darei para Marina. É justo? Hoje ela está a crescer e aprender, coordenação motora, inteligência espacial, o que mais encanta, e diverte, e necessário, é o aprendizado da fala, da língua. Já evoluiu muito, nossa linguagem é quase comum: o que para mim é bola, ela chama de bóia; a chupeta é peta, blusa é uda; você é ôce (reminiscências de Ibitinga); Chico é kiko, carro é carrô, travesseiro, amplitude, gnóstico, licenciosidade, constitucional, para ela é tudo arrrg, urghh, oooorg, ergggh.
O que fará ela quando souber que o computador se chama computador? Tendo conhecimento do nome das coisas, faz-se imperioso ter consciência da utilidade das coisas, e saberá que um computador computa (!!!!), pensa em bytes, tem memória, periféricos, programas, linguagem, e é usado para processar textos, efetuar cálculos, editar imagens. Certamente ela não irá mais abri-lo, sentar-se sobre o teclado, apertando todos os botões à mão, divertindo-se com os sons e as figuras que alternam-se na tela. Ela trela, por que não sabe o que é isto.
Seria negligência minha se não a ensinasse, se não procurasse todos os dias preencher as lacunas da estante, para que ela tenha para ler todos os livros que devem ser lidos; se não tocasse um rock, um blues, no interlúdio de seus discos infantis; se não me detivesse para olhar uma rosa, rodear um aquário, imitar os pássaros, banhá-la no pacífico e no atlântico, navegar no tiete e escorregar nas cachoeiras de minas, para compor um ser que atinja à aspiração pedida por Goethe, depois de três mil anos tenha o saber, e possa fazer suas próprias escolhas.
Papai, mamá! E lá me vou a preparar-lhe o leite, que toma já enrodilhada nos meus braços, um suspiro de satisfação, o desenho de um sorriso nos lábios, olhos fechados, dorme neném, que na ausência de deus (nem isto posso lhe dar), teu pai vela seu sono, e sussurra às estrelas para que desçam aos seus sonhos.
Canto de Ninar (Raul Seixas)
Nada tão belo como uma criança dormindo
Nem tão profundo como dormir sem sonhar
Nem tão antigo como o sonho dos teus olhos
Nem tão distante como a hora de acordar
Dorme enquanto teu pai faz músicas
Que é a forma dele rezar
Todos os sonhos na realidade
São verdades, se eu puder cantar
Você chora quando tem fome
Mas vem logo uma mamadeira
Amanhã se você chorar
Vai chorar tua vida inteira
Fiz meu rumo por essa terra
Entre o fogo que o amor consome
Eu lutei mas perdi a guerra
Eu só posso te dar meu nome
Ao Nosso Filho Morena (Oswaldo Montenegro)
Se hoje tua mão não tem manga ou goiaba
Se a nossa pelada se foi com o dia
Te peço desculpas, me abraça meu filho
Perdoa essa melancolia
Se hoje você não estranha a crueza
Dos lagos sem peixe da rua vazia
Te olho sem jeito, me abraça meu filho
Não sei se eu tentei tanto quanto eu podia
Se hoje teus olhos vislumbram com medo
Você já não vê e eu juro que havia
Te afago o cabelo, me abraça meu filho
Perdoa essa minha agonia
Se deixo você no absurdo planeta
Sem pique-bandeira e pelada vadia
Fujo do teu olho, me abraça meu filho
Não sei se eu tentei mas você merecia
E minha convicção? A sentença de pedra que, a exemplo de Nietszche, proferi? “Filhos, não quero tê-los, jamais os terei”. Como tudo que digo é resultado de uma reflexão, de muita reflexão, da impressão de leituras, do que me fica das conversas, do que aprendo dos exemplos, que Hugo afirma não ser a melhor coisa da vida, mas a única, das análises e exercícios de futurologia, explico como cheguei a esta afirmação.
Somos humanos, temos de crer nisto. Somos animais, somos espécie, por mais evoluída (os naturalistas podem achar que menos) que seja esta espécie, funcionamos como todas as demais da fauna terrena, nosso impulso primordial é a perpetuação. Com sete bilhões de pessoas habitando, neste exato momento, este mundo, a raça humana pode dispor de mim para sua continuação (imaginem, neste mesmo exato momento, quantas crianças estão sendo geradas, nas alcovas do mundo afora).
Descartado este primeiro motivo, o fundamental, o segundo, existencial, vai-se fácil. O desejo de ter filhos é o ápice de nosso egoísmo, precisamos de alguém para incutir nossos valores, para ser a nossa imagem e semelhança, para realizar nossas frustrações. Eu sou tão egoísta, que nem isto quero partilhar.
Pronto! Filhos, melhor não tê-los! E eu parava por aí a leitura do Poema Enjoadinho. Mas tive uma filha, e façam-me um favor, não queiram entrar neste mérito, vasculhar a história, o que acontece em uma cama ardente, cabe só a quem se incendeia.
O que está posto agora é, o que virá? O mundo continua sua degradação (lembram-se, eu dizia há vinte anos atrás que da Patagônia à fronteira norte do México seria apenas uma única favela – e será – com pequenas ilhas de civilidade - será?- , e o jardim amazônico devidamente internacionalizado), o homem cada vez mais vil, o tal vil metal que cada vez mais poucos vêem, a superstição e a fé mística avançam mais que o conhecimento científico, embora este se multiplique à velocidade dos ultra-mega-super-giga-bytes.
Este é o mundo e este é o conhecimento que darei para Marina. É justo? Hoje ela está a crescer e aprender, coordenação motora, inteligência espacial, o que mais encanta, e diverte, e necessário, é o aprendizado da fala, da língua. Já evoluiu muito, nossa linguagem é quase comum: o que para mim é bola, ela chama de bóia; a chupeta é peta, blusa é uda; você é ôce (reminiscências de Ibitinga); Chico é kiko, carro é carrô, travesseiro, amplitude, gnóstico, licenciosidade, constitucional, para ela é tudo arrrg, urghh, oooorg, ergggh.
O que fará ela quando souber que o computador se chama computador? Tendo conhecimento do nome das coisas, faz-se imperioso ter consciência da utilidade das coisas, e saberá que um computador computa (!!!!), pensa em bytes, tem memória, periféricos, programas, linguagem, e é usado para processar textos, efetuar cálculos, editar imagens. Certamente ela não irá mais abri-lo, sentar-se sobre o teclado, apertando todos os botões à mão, divertindo-se com os sons e as figuras que alternam-se na tela. Ela trela, por que não sabe o que é isto.
Seria negligência minha se não a ensinasse, se não procurasse todos os dias preencher as lacunas da estante, para que ela tenha para ler todos os livros que devem ser lidos; se não tocasse um rock, um blues, no interlúdio de seus discos infantis; se não me detivesse para olhar uma rosa, rodear um aquário, imitar os pássaros, banhá-la no pacífico e no atlântico, navegar no tiete e escorregar nas cachoeiras de minas, para compor um ser que atinja à aspiração pedida por Goethe, depois de três mil anos tenha o saber, e possa fazer suas próprias escolhas.
Papai, mamá! E lá me vou a preparar-lhe o leite, que toma já enrodilhada nos meus braços, um suspiro de satisfação, o desenho de um sorriso nos lábios, olhos fechados, dorme neném, que na ausência de deus (nem isto posso lhe dar), teu pai vela seu sono, e sussurra às estrelas para que desçam aos seus sonhos.
Canto de Ninar (Raul Seixas)
Nada tão belo como uma criança dormindo
Nem tão profundo como dormir sem sonhar
Nem tão antigo como o sonho dos teus olhos
Nem tão distante como a hora de acordar
Dorme enquanto teu pai faz músicas
Que é a forma dele rezar
Todos os sonhos na realidade
São verdades, se eu puder cantar
Você chora quando tem fome
Mas vem logo uma mamadeira
Amanhã se você chorar
Vai chorar tua vida inteira
Fiz meu rumo por essa terra
Entre o fogo que o amor consome
Eu lutei mas perdi a guerra
Eu só posso te dar meu nome
Ao Nosso Filho Morena (Oswaldo Montenegro)
Se hoje tua mão não tem manga ou goiaba
Se a nossa pelada se foi com o dia
Te peço desculpas, me abraça meu filho
Perdoa essa melancolia
Se hoje você não estranha a crueza
Dos lagos sem peixe da rua vazia
Te olho sem jeito, me abraça meu filho
Não sei se eu tentei tanto quanto eu podia
Se hoje teus olhos vislumbram com medo
Você já não vê e eu juro que havia
Te afago o cabelo, me abraça meu filho
Perdoa essa minha agonia
Se deixo você no absurdo planeta
Sem pique-bandeira e pelada vadia
Fujo do teu olho, me abraça meu filho
Não sei se eu tentei mas você merecia
terça-feira, 23 de julho de 2013
CINCOS ANOS
A vida respira e pede
...Marina
A flor do meio-dia
A cor do amanhecer
A melodia do riso
... o paraíso
O mel de seus olhos
Olham o mundo crescer
Vêem a gente bonita
Os bichinhos medonhos
... os sonhos
De aprender palavras
De dizer poesias
De correr meninices
Desenhar nossa imagem
... maquiagem
Batom, esmalte e
pose
De princesa
De coelhinha
De você, nossa pequenina
... Marina
(o “s” em cincos não é licença
poética, é como Marina pronunciava os números quando estava a aprender a
contar... dizia: “eu tenho quatros anos e vou fazer cincos anos... agora fez, e
está a fazer rimas... outro dia me perguntou: “pai, você não vai?... e com
aquela cara que criança faz diante de uma descoberta: “rimou!”... considero
esse seu primeiro verso...)
23/07/2013
RASCUNHO DE GENTE
um raio de sol
uma semente
lua nova
borboleta
gotas de chuva
botão de flor
acorde de blues
amanhecer
rascunhos
de versos
de cores
de gente
riso
dança
festa
fogueira de São João
o vale do Douro
olinda
ainda mais bela
será ela
tudo o que renasce
nasce com Marina
a pequena estrela bailarina.
“somente
quem tem o caos dentro de si
pode
dar à luz a estrela bailarina”
F. Nietzsche
23 de julho de 2008
sexta-feira, 19 de julho de 2013
IRREVERSÍVEL
se
tento o impossível
menos
consigo
entender
aceitar
o
mundo crível
o
mundo imundo
em
que nasci
por
improviso
acidente
sem
motivo
à
toa
ao
léu .
se
tento o possível
menos
consigo
viver
a vida
reta
abjeta
que
dizem ser o caminho.
caminho
no meu eu
só
insano
risível
irreversivelmente
perdido
de
tudo que não há em mim.
terça-feira, 16 de julho de 2013
TU, UTENTE
abrir-lhe as partes
para tomar posse...
da parte que me cabe
penetrar-lhe com o verbo
para ouvir seu corpo
repetir substantivos gozos...
a língua queima
a gruta reage, no líquido que emerge
para tangenciar o ardor
molhada outrora
lambuzada senhora
cavalga ilhargas anímicas
as minhas, que jamais foram suas
ou serão... senão nesse instante
senão nesse verso...
quarta-feira, 10 de julho de 2013
A PELE E A MENTE
a pele dá
tesão
encosta,
arrepia, queima,
é só ato
movimento,
estertor.
a pele pede e
toma
sacia-se e vai
embora,
só se assanha a
tez
se a encontra outra
vez.
ou talvez a
consumação a consuma.
perde o
encanto, não há mais o que
se fantasiar,
torna-se ato.
a sedução ideária não.
não é seu
corpo que pede,
é sua alma
que deseja.
ficamos mais
excitados com uma bela
narrativa que
com um toque caliente.
então eu
pergunto,
eu te provoco?
onde?
no suor do
lábios?
no arrepio dos
seios?
no desvio do
olhar?
é sua pele a
provocada?
ou são seus
pelos?
serão suas
ousadas mãos?
ou a flor que
lhe nasce abaixo do ventre?
as coxas, as
costas, os dentes?
ou te provoco
toda desde a mente?
o que sente?
quando a voz
rouca manda-lhe ficar calada
mas o olhar
intenso que vai e vem
causa-lhe
gritos...
safada
amada
tarada?
eu te provoco?
quando?
ontem
hoje
e sempre?
agora, em que
as palavras
te penetram
lentamente
e gozas
plenamente?
gozo solo em
tuas próprias cavas
e tu, sabes o
que me causas?
sexta-feira, 5 de julho de 2013
UM CÁLICE DE CICUTA
espero que jamais seja tarde
sobre sempre o tempo
necessário,
o emissário negro se atrase
e possamos nos reconciliar com nossas renúncias,
as denúncias de que amamos pouco sejam retiradas
- amaremos tanto que esqueceremos o que é amor,
as desculpas que pedimos sejam ignoradas
- fizemos o que fizemos, não há o que refazer;
as dores que causamos sejam recuperadas
- tudo é dorido, pensar dói, não se acaba,
as palavras que proferimos sejam ouvidas
- não pedimos que sejam compreendidas, apenas ouçam, ouvidos
moucos, ouçam!
e se já for tarde, fiquemos um pouco mais
o arroz vai queimar
o trem vai sair
a musica vai acabar
o dia vai escurecer
e nós aqui, entre um gole de esquecimento e uma porre de
isolamento
o tédio engrandece uma vida,
o que eu fiz, o que eu não fiz, o que eu quis?
planos para o passado alimentam a alma vazia
a alma que dói, dor de ter vivido cedo
c a n s a d o cedo, amado sempre
perdido no quando...
eu quero voltar a medir meu tempo pela emoção
- pelo tesão
por aquela sensação de arrogância e ambição e desespero
de quem não espera,
esses a morte não alcança, eles vão à lança
trespassados, transidos, translúcidos
sentados à poltrona de uma ampla varanda burguesa
à tarde, vento morno, sol poente avermelhado
parece poesia, quem vê aparência
nada sabe da essência inconformista,
do que não fala o que não escuta
- esse é o poeta
ai dele!
ai dele!
que jamais seja tarde
para um brinde de cicuta.
segunda-feira, 1 de julho de 2013
CATARSE
Observei dois sonhos que se beijavam,
um feito de amor o outro ausente de ódio;
lindos emocionaram-me,
puxaram duas lágrimas gêmeas.
Nascedouros, o mesmo sentimento,
caíram, todavia, de diferentes olhos
que tinham o mesmo
olhar para
as lágrimas que se afastavam.
Sorri
um meio sorriso,
todo
ele de esperança que a dor fosse
de fato
fingimento,
porque
não o sendo, seriam duas dores:
uma
de sofrimento e a outra de desilusão.
Parei
de pensar e não morri,
parei
de morrer e não vivi;
parei
de esperar e não cheguei,
parei
de chegar e não encontrei;
parei
de procurar, só não parei de parar.
Escrevi
a carta de despedida
mas
não consegui me dizer adeus,
pedi
a deus que me fizesse crer
nele
e em seu mundo;
rompi
com os homens porque não os teria,
rompi
com as mulheres porque as queria.
Desta
catarse sobraram poucos pedaços,
os
que caíram marcam minha estada no tempo
dos
que ficaram farei meu recomeço no espaço,
afinal,
eu sou meu sol,
e
ainda há muitas auroras por acontecer.
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